quarta-feira, 14 de março de 2012

Vida nova

Há coisas para as quais não nos preparamos. A vida, inesperada, faz isso por nós. Depois da alegria de um filho, as diferenças. No emprego muda tudo: a função, os prémios, o ordenado.

Descontado o carro que ainda se paga, prémio não ganho: final do mês € 583.13 transferidos para a conta bancária. € 367.20 de seguro do veículo para pagar. Casa alugada: vida vasculhada de trás para a frente, reuniões com construtores, o recibo de vencimento na mão e a pergunta ‘Com aquilo que ganha, acha que consegue pagar uma casa?’, fiadores ao ‘barulho’, a vontade de chorar, dois meses de renda adiantados, meia dúzia de bens absolutamente necessários comprados, o mealheiro de um filho assaltado, que se enchia desde que nasceu e engordava a conta bancária para um dia mais tarde - destinado a comprar um sofá (e a vontade de chorar outra vez).

Foi-se o calcanhar de meia poupado sem grandes sacrifícios, outrora. Vacinas, leite, papas, 80 € em fraldas para aproveitar promoções e talões (virei uma típica dona de casa americana atenta a tudo o que se compra com cupões e descontos) – dia 12 – saldo bancário € 2.07.
Subsídio de férias já hipotecado. Nem te atrevas a chorar, engole o choro, faz-te mulher!

Faz listas. E mais listas. O que ainda falta comprar? O que posso comprar? Estabelece
prioridades. Um mês isto, outro mês aquilo. O que faz falta. SÓ o que faz falta.

Esquece o tempo das roupas e carteiras de marca, dos cremes para a cara, dos perfumes,dos sapatos, do charme, dos restaurantes, das lojas que gostas, dos dentistas e médicos com frequência. Centra-te no básico. A vida muda. A tua e a do teu filho mudou. Conhecida esta realidade e não outra qualquer para ele dá no mesmo. ‘Comida não vai faltar’ é o que ouves dizer.

Ouvi muito uma música enquanto estava grávida da minha banda favorita, DMB, whatelse?
(tão predestinadora!):

"Work our souls, fingers to the bones, cut the marrow, drain my soul,

Pay your dues and your debts, pay your respects,

Everybody tells you, you pay for what you get, you pay for what you get…"

terça-feira, 13 de março de 2012

Didn’t see it...

Podemos viver na borda de um precipício e...ainda assim...não predestinarmos, não só o empurrão, mas a brutal queda para a qual sempre estivemos destinados. Invulgarmente, empurram-nos sozinhos, arrastando connosco pessoas, espaços, sentimentos e coisas às quais vivemos agarrados com a pretensão de nos terem pertencido de forma inequívoca. Queda célere, rápida, mortal, interior, exterior. Preservados achavamos estar por uma bolha de amor fermentada por acontecimentos da vida, marcantes apenas (... )para nós.

Um dia somos amados. Como sempre achámos ter sido. Encostados estávamos já à borda do precipício, desterrados sem conhecimento. Dez dias depois, pesado pé que nos calca, fere e arrasa o melhor de nós para uma queda livre, sem precedentes. ‘Já não te quero!’ Não importa o que pensas, sentes, o que dizes, a cara que fazes, o que imploras, a explicação que pedes, as dúvidas que te assaltam, as lágrimas que choras, os problemas que tenhas, o carinho que imploras. ‘Não quero saber!’ Nunca mais interessa o que foste, o que deste, o que ouviste, o que te prometeram, o que te entregaste, o que viveste, no que acreditaste, nos planos que fizeste, as vezes que tentaste. Não és notada ou reconhecida. Não tens valor. És menos que nada. És má mãe, má mulher, má companheira (a pior), má amante, má dona-de-casa, má pessoa, má-tudo. ‘Não quero ouvir o que dizes, não te posso ouvir.’

E acreditas.
Achas-te tão injustiçada,
mas acreditas.
Apenas porque não entendes como é possível teres sido alvo de tamanho engano, não acreditas que haja pessoas tão corajosas e imprevisíveis assim. Não acreditas. E como no teu mundo não existem pessoas tão vis, a culpa é tua. O mal está em ti. Quem te mandou não vires embora quando tiveste vontade e a borda estava longe? Quem te mandou voltar de cada vez que te pediram e até imploraram? Quem te mandou deixares-te tocar pelo desespero e insegurança dos outros? Quem te mandou acreditar quando te diziam que eras perfeita? Quem te mandou crer que eras a melhor pessoa que se tinha conhecido? Quem te mandou não seres mais bonita, mais obediente, mais ... tudo?

Um dia foste boa. Um dia foste tudo: alma-gémea, o mundo, a companheira de vida, a mãe ideal para filhos futuros e que se queria até para filhos não-teus. A vida não fazia sentido sem ti. Eras necessária, imprescindível, tapavas furos e falhas, acalmavas angústias e medos de separações recentes, de relações parentais estragadas, de situações profissionais impossíveis. Nunca pensando em somar, subtrair ou multiplicar o que estava a ser-te pedido ou retirado, sempre pensando que do amar fazem parte estes requisitos, deveres e obrigações com a consciência de que um dia precisada, um dia paga na mesma moeda.

Inocente criatura.

Não saberia fazer diferente. Peçam-lhe todos os sacrifícios do mundo, mas para amar com reservas, de pé atrás, impedida de pisar terrenos que deviam ser OBRIGATÓRIOS....não sabe.