quarta-feira, 18 de junho de 2008

Coragem

É dos fracos que a história não reza. São os fortes que lhes ganham a corrida aos pontos e nos momentos mais importantes. Não deveriam ser estes, mas os puramente românticos a ter lugar no pódio e a trajar a camisola amarela. Tinha que dizer isto hoje, pois foi hoje (e é tão raro) que presenciei um acto de amor.

Trabalho num edifício que tem uma vista panorâmica privilegiada da cidade do Porto, muito próximo da Ponte da Arrábida. Estava a executar mais uma das muitas tarefas enfadonhas que me cumpre fazer quando olho lá para fora e vejo uma avioneta a rasgar o céu com uma mensagem que dizia: ‘Amo-te Patrícia. Fica comigo’.

Fiquei totalmente rendida. Ficámos totalmente rendidas. Eu e todas as outras mulheres do departamento, arrisco mesmo a espraiar a rendição a todas as mulheres do edifício que tem nada mais, nada menos do que nove andares. E que eu saiba essa tal de Patrícia nem sequer cá trabalha! Não há justiça neste mundo!

Fiquei a pensar ‘e se este tipo se deu a este trabalho (e dinheiro) todo para esta mulher nem sequer ver a mensagem’? – que desperdício de euros, esforço, recursos, coragem e paixão. É por um momento deste que uma mulher espera uma vida inteira. Abençoados os homens/amantes com este tipo de sensibilidade (para alguns será desespero) e com coragem e ambição para aparecerem a ‘nu’ perante o ser amado e com público a assistir. Uma coisa vos garanto, todas as mulheres que assistiram a isto ficaram embevecidas e asseguro-vos que a maior percentagem delas nem sequer se chamava Patrícia!

segunda-feira, 16 de junho de 2008

Afazeres

Uma grande parte das nossas vidas é escrita, registada e, escrupulosamente, listada. Há uma necessidade organizacional inata em nós que nos faz listar o que é importante, o que é útil e (muitas vezes) não é, mas que não tencionamos olvidar.

É a lista das compras que é urgente fazer, a lista dos casamentos e prendas a receber, o rol dos convivas que queremos convidar, a relação do que queremos na mala antes de viajar, a lista das prendas que desejamos ofertar, o ror das pessoas cujos aniversário não pretendemos esquecer, a relação dos livros que ainda queremos ler, a lista dos ingredientes daquela sobremesa perfeita a rematar o jantar a dois, a lista dos sonhos por concretizar e dos sítios estupendos que queremos conhecer.

De todas estas listas que fazemos mental, intelectual e até fisicamente, a maioria das vezes sem sabermos, podem ser de dois tipos: as ‘de certeza’ e as ‘talvez’. É incrível como só me dei conta disto 31 anos após ter nascido….mas é verdade! Talvez ande um nadinha distraída. As primeiras são as que temos mesmo que fazer, impreterivelmente e sem lugar para dúvida. As segundas queremos fazer ou podem vir a ser feitas mas não significa que a nossa vida dependa disso ou tenhamos um prazo cronológico muito definido para as realizarmos. Uma coisa aprendi, mas também não era difícil, ainda que eu ande, como já disse, desatenta: uma ‘talvez’ pode vir a transformar-se numa ‘de certeza’, mas uma ‘de certeza’ nunca será uma ‘talvez’.

domingo, 15 de junho de 2008

Miolo

É profundo o que sinto.
É enorme, está cavado bem fundo, bem lá no fundo. Em palmos ou peso é imensurável, mas em profundeza.....
Tudo o que vivo, transpiro e sinto é mensurável em profundidade. O resto não conta...ou melhor, conta, mas é anexo, apêndice.
O que existe de mais precioso é o que está guardado, cosido e costurado no mais íntimo e recôndito espaço de cada um de nós.
Porquê?
Porque o resto todos vêem, observam, contemplam, analisam, tocam, sem consentimento....o que está de fora, o corpo e os seus movimentos, gritos e atitudes estão ao alcance daqueles de quem gostamos muito, pouco ou mesmo nada. Não tem valor especial, não é distinto, é imitação de comportamento repetido em série vez após vez...
O que é único, específico, exclusivo e ímpar em cada indivíduo só se dá a conhecer a um número muitíssimo reduzido de pessoas: os privilegiados.
É dessas e com essas personalidades que se escreve a nossa vida. São eles que fazem parte dela, a compõem e compreendem. São os actores principais no meio de milhares de actores acessórios, acidentais e secundários.
É aos principais que abrimos a porta da frente e, ao mesmo tempo, a porta das traseiras e todas as janelas, frinchas, entradas, saídas, portões, grades, escapatórias, portagens (as quais, deliberadamente, tornamos gratuitas e sem ingresso obrigatório).

Destas almas tão importantes e oportunas não queremos nós separar-nos. Estão agarradas e são absolutamente necessárias....senão a quem poderíamos nós virarmo-nos do avesso? Quem nos iria aplaudir ou ralhar quando os holofotes da ribalta estivessem para nós virados? A quem haveríamos nós de evidenciar ou ofertar o nosso protagonismo? A resposta é fácil.....para quem gravita em torno de nós, no mesmo palco de partilha da vida, dos sentidos e sentimentos mais inócuos e castos. Neste nosso cenário onde não há distinção entre actor principal e secundário, onde todos escrevem história sem maior ou menor grau de omnisciência ou omnipresença. Quem pisa o palco é conhecedor, participa, escreve por linhas direitas e tortas, vive e revive. O ‘público’ é absoluta e necessariamente o mais desconhecedor, está ali por acréscimo (alguém tinha que pagar o bilhete). Estou-me nas tintas para os seus elogios, louvores, críticas, apupos, vaias ou aplausos. Não é destes que reza a minha história.

Curtas

Plágio é o maior elogio que podemos fazer a alguém.