sexta-feira, 2 de novembro de 2007

O Silêncio


Podemos ser tentados a achar que o silêncio é o nada, o vazio; é inaudível, incolor, inodoro, insosso, sem valor.

Que visão tão redutora…

O silêncio é arma, é grito, é opinião, é voz para quem não pode ou quer falar; tem significado e pode fazer mais sentido do que um punhado de palavras; incomoda (ou não), é mordaz, é crítico; preenche, faz falta, apazigua, acalma, dá um estatuto a quem quer (ou não quer) opinar.

É o voto em branco, mas que é voto e tem valor; é o choro engolido do miúdo de 8 anos que acabou de esfolar o joelho e, dolorosamente, cumpre a (tão mal) incutida máxima de que ‘um homem não chora’; é o cordão que liga ao mundo o surdo-mudo que comunica por gestos, mímica e ‘salamaleques’ e lê, nas bocas dos outros, as linhas e entrelinhas de uma voz que lhe é surda; é a forma de vida de quem vegeta numa cama ou cadeira enferma de invalidez precoce ou de quem está suspenso numa anestesia geral aguardando que a vida continue umas horas, umas dores e uma cicatriz adiante; é a voz dos raptados, violados, tidos e mantidos em forçado cativeiro que querem gritar uma liberdade ansiosa e, demoradamente, aguardada, mas mantida num sepulcro total e sem hipótese de fuga; é o lamento sofrido de quem perde alguém para a morte e se enluta num sinónimo de dor e numa capacidade mutável de aceitar a perda como consequência inegável da vida.

Depois disto, quem se atreve a delinear relações de sinonímia entre o silêncio e o nada?
O silêncio é de ouro. Precioso pelo que não diz, mas principalmente pelo que diz.

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