quarta-feira, 19 de dezembro de 2007

Mais do que isto…


É fácil transformarmo-nos em peritos ou filósofos em relação àquilo que vemos, especialmente quando sentados num sofá com um copo de whisky a emoldurar-nos a mão e a inflamar-nos o espírito.

Quando, feitos actores, encarnamos este tipo de personagem, o que vemos, basicamente, é muito semelhante à visão que temos quando conduzimos um carro: observamos a paisagem que nos vai nascendo à frente e, quando muito, fugazmente, a que ‘retrovisoramente’ assistimos ou a que nos vai escapando dos lados. Redutoramente, não observamos o que se passa em cima ou em baixo.

A lua, por exemplo, ‘mora’ lá em cima, todos os dias empurra o mar fora e dentro, controla o ciclo menstrual, apadrinha a desova do peixe-rei e todas as histórias de amor e, dizem as estatísticas que, na sua fase cheia, o crime por homicídio cresce três vezes mais do que o normal.

A água está presente em todo o lado. No mar, no céu, na terra, nos olhos, no copo, no banho, na pele. Mata por excesso e por escassez. Dá vida e tira. Limpa, lava, suja, molha, infiltra-se.

A terra é vida semeada. É fonte de alimento. É também para pisar, amar, fecundar, conquistar, vender, comprar, cuidar. É territorial e patrimonial. Acolhe, divide e une. É chão, é berço, é objecto desejado e tantas vezes impiedosamente roubado, é tradução de poder em nome do qual se mata, esfola e escraviza.

O ser humano é mãe, pai, homem, mulher, criança. É empregado, é patrão, escravo de algo ou alguém. É bom, mau, cruel - tanto faz. Não deixa de o ser, mesmo quando não parece. Existe também nos outros, naquilo que nos é dado ver e no que está escondido. É composto, indivisível, complicado e simples. Falha e acerta, ama e ‘desama’, esconde e revela, escolhe e não escolhe. Não é perfeito, embora pretenda ser – é, antes, humano.

Significado: há sempre mais do que isto.

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